03 abr
Faça você mesmo um sítio na cidade
No post anterior, falei sobre a importância de reinventarmos nossa relação com a cidade tendo a agricultura em espaços públicos como fio condutor. Agora, compartilho com vocês uma ideia diferente, a das roças urbanas caseiras, uma maneira de ter uma vida mais saudável, bucólica e cheia de boas encrencas para resolver. Você vai descobrir que não importa onde você vive – apartamento, casa alugada ou quitinete – existe sempre um lugar onde produzir alimentos e ser autossuficiente na cidade.
Em primeiro lugar, deixe de lado a fantasia de um dia mudar-se para o campo – a cidade oferece trabalho, vizinhança, vida cultural e muitas opções de serviço – e comece a empreender sua vida rural e independente agora, no coração da metrópole. O movimento que levou hordas de hippies a viverem em comunidades no meio do mato está repaginado. Emprega técnicas da agricultura ecológica, da criação de animais, da permacultura, do uso eficiente de recursos naturais e produção de energia adaptados para o ambiente urbano para fazer a revolução da economia doméstica. Produzir seu próprio alimento, mesmo que só um pouquinho, ao invés de comprá-lo, garante mais qualidade e sabor e muda a relação com a comida e com o ato de comer. Acredite, há mais poder em criar do que em gastar. Por de pé um oásis urbano é encarar problemas estimulantes e divertidos de resolver.
No quintal, árvores frutíferas, flores, legumes e verduras convivem em harmonia. Atrás do aparente caos, há sinergia e ajuda mútua entre as plantas. O milho cresce e dá estrutura para o feijão trepadeira, que fornece nitrogênio ao solo, enquanto as grandes folhas da abóbora protegem a terra do sol e chuvas fortes. Quanto mais diversas as combinações de plantas, mais resistente é o jardim (e mais divertido o trabalho).
A composteira ou o minhocário são a conexão da cozinha com a horta. Abasteça o caixote com restos de comida (nada de carnes nem laticínios), coco de galinha, casca de ovo moída e poda de jardim e deixe o trabalho sujo com as minhocas. Em três meses, você terá adubo do melhor.
É na cozinha que se aprende a antiga arte de conservar o que você plantou. A colheita vem de uma vez só, então faça picles de legumes (cenoura, pepino, nabo, rabanete), geleia de frutas, caldo de legumes. Seque ervas (como chás ou temperos), asse seu próprio pão, fermente malte e produza cerveja caseira. Daí compartilhe com amigos (e elimine as idas ao shopping a cada aniversário).
Pode parecer esquisito, mas uma roça urbana prevê até bicharada, pois os animais são aliados em um sistema ecológico. As galinhas são fáceis de criar, não requerem muito espaço, põem ovos todos os dias, alimentam-se de restos vegetais e seu cocô é ingrediente bem-vindo na compostagem. E ainda gostam de caçar insetos pestilentos e de comer as ervas daninhas do jardim. Uma colmeia pode produzir até 20 quilos de mel por estação e fornece própolis, geleia real e cera e poliniza frutas e vegetais. Boa notícia: ocupa tão pouco espaço que cabe até na varanda.
E se não há nenhum pedaço de terra por perto, existe, pelo menos, uma janela. E isso basta para erguer uma horta em jardineiras, baldes e latas. Misture cebolinha com alface, ervas com feijão, pepino com dill. Nessa relação de companheirismo, uma planta favorece o que a outra tem de melhor e poupa seu trabalho. Lembre-se de usar vasos profundos para plantas de raiz, como cenoura e beterraba e apoio com fios de nylon entre o para-peito e o teto para feijão, chuchu e tomate. Na roça urbana, até a garagem pode ser aproveitada. A umidade e temperatura são perfeitas para cultivar cogumelos. Você só precisa de um kit para começar (à venda na internet), e nunca mais vai pagar caro por essas delícias.
Cada sitiante urbano tem a oportunidade de explorar sua roça como bem queira. Há quem venda o excedente para aumentar a renda, há pais que querem ensinar conceitos de ciência pra os filhos, há quem se importe muito com a origem do alimento. Seja qual for seu talento, nada é tão relaxante quanto sentar-se na varanda e flagrar o vai-e-vem da bicharada no quintal.
Autora: Tatiana Achcar